Formar uma equipe multidisciplinar com profissionais que possuam habilidades comportamentais variadas, capazes de fazer diferença no dia a dia e potencializar os resultados das empresas, não é uma tarefa simples. No entanto, à medida que as empresas compreendem cada vez mais os benefícios e a grande relevância da diversidade, outro aspecto da inclusão tem sido objeto de debates: como incluir também os profissionais neurodiversos, aqueles portadores do Espectro Autismo, dislexia, TDHA e outras condições neurológicas diferentes das consideradas típicas.

Antes de analisar a inclusão desses profissionais, é importante explicar o conceito de neurodiversidade, que se refere às variações naturais no cérebro humano em relação à sociabilidade, aprendizagem, atenção, humor e outras funções cognitivas. Enquanto a maioria dos indivíduos é considerada neurotípica, aqueles que experimentam padrões de pensamento, comportamento e aprendizado diferentes da média são considerados neurodiversos.

Assim como outras formas de diversidade, a neurodiversidade oferece muitas vantagens para as organizações, incluindo maior produtividade, inovação e qualidade. Empresas líderes, como Google, Microsoft, J.P. Morgan, Ford e Amazon, já implementaram iniciativas para ampliar a inclusão de profissionais neurodiversos.

Estima-se que 20% ou mais da população mundial possa ser categorizada como “neurodiversa”. No entanto, apesar da prevalência da neurodiversidade e do aumento da conscientização sobre ela, as estatísticas mostram que nós como sociedade ainda não conseguimos fazer os ajustes adequados para indivíduos neurodiversos.

No mercado de trabalho, a neurodiversidade apresenta diversos desafios, como evidenciado pelo fato de que apenas 16% da população portadora do espectro autismo no Reino Unido está empregada, de acordo com a National Autistic Society. No Brasil, a inclusão de profissionais neurodiversos é considerada um ponto de atenção nos programas de diversidade das empresas, amplificado pela falta de informações sobre essa população.

De acordo com o Ministério da Saúde, existem cerca de 2 milhões de pessoas nessas condições, mas, devido à dificuldade de diagnóstico, esse número pode estar subnotificado. Transtornos como do espectro autismo, TDAH e dislexia são geralmente associados a crianças e adolescentes, mas há muitos adultos neurodiversos que desconhecem seu diagnóstico. Esses adultos enfrentam maiores dificuldades de acesso ao mercado de trabalho e, quando contratados, encontram obstáculos para avançar na carreira devido à falta de preparo das empresas em acolher suas diferenças ou à falta de habilidade dos colegas em lidar com certos aspectos da neurodiversidade.

Atualmente, as empresas contam com o apoio de avaliações psicométricas para a seleção, retenção e promoção de profissionais, pois essas avaliações permitem descobrir o perfil e as habilidades comportamentais dos indivíduos. E no contexto dos profissionais neurodiversos, qual é o papel dessas avaliações?

As diferenças no processamento de informações, pensamento e comportamento, como observadas entre os indivíduos neurodiversos, estão diretamente relacionadas à realização dessas avaliações. Isso ocorre principalmente devido às várias manifestações das condições neurodiversas, o que dificulta prever o impacto dessas diferenças nos resultados das avaliações.

Buscando entender melhor essa questão, a equipe de psicologia da Thomas International, líder global em avaliações psicométricas, conduziu uma pesquisa para investigar as variações nas avaliações de diferentes grupos de indivíduos. Embora tenham sido encontradas pequenas diferenças entre os neurotípicos e aqueles que se autodescrevem como neurodiversos em algumas das áreas avaliadas, é difícil tirar conclusões robustas devido à complexidade dos dados coletados.

No entanto, ficou claro que a ideia de que os indivíduos com condições neurodiversas pontuam abaixo da média nas avaliações não é verdadeira e pode até mesmo ser considerada preconceituosa, pois, em geral, eles pontuam acima da média na Avaliação de Aptidão da Thomas. Em última análise, não podemos ter certeza de como a neurodiversidade afetará os participantes das avaliações, portanto é importante realizar ajustes nas avaliações caso a caso.

Para garantir a inclusão desses profissionais, temos algumas dicas que podem proporcionar segurança psicológica aos neurodiversos durante sua participação nos processos seletivos das empresas. Os gestores e profissionais de RH devem deixar claro o que esperam dos candidatos, para que estes não sejam surpreendidos durante o processo de avaliação. Além disso, é importante criar um canal de comunicação com o candidato que o deixe à vontade para revelar qualquer condição neurodiversa relevante. Não se deve forçar os candidatos a realizar avaliações, e tomar uma decisão sobre um candidato apenas porque ele não fez uma avaliação também é algo que deve ser evitado.

O mais importante é garantir aos candidatos que sua neurodiversidade não afetará de forma alguma sua participação na seleção, fornecendo orientações sobre eventuais ajustes no processo de tomada de decisão e na ponderação da entrevista, caso eles decidam não participar ou optem por fazer apenas algumas das avaliações.

*Tais Rocha de Souza – Psicóloga e Diretora de Operações do Grupo Soulan